"Alicerce não desmorona..."
por Sylvio Carlos Galvão
No mínimo, com baixa probabilidade, as
chances que a primeira-dama tem de ‘enturmar-se’ no rol decisor devem ser bem aproveitadas. Não as
havendo, a primeira-dama poderá criá-las na proporção que desejar seguindo os
seguintes conselhos:
Exija:
1)
A
subordinação direta da secretária do prefeito, mas nunca seja uma. Assim,
mantenha-se atualizada da agenda do chefe do executivo;
2)
Afaste-se
‘quilometricamente’ do chefe de gabinete com o intuito seguro de provocar neste
personagem um respeito epifânico. Talvez isso provoque um clima de inimizade,
sim, mas, apenas talvez. Não importa se isso ocorrer. O que não pode ocorrer
são hostilidades. Trate-o sempre cordialmente e com respeito (aliás, ele é um
chefe), e só se intimize com ele na presença do marido – isso como regra. Se é
necessário mais motivos para esta sugestão, saberemos ocupar o pouco espaço que
temos neste livro: o chefe de gabinete é o homem forte do governo e a primeira-dama
deve ser a mulher forte;
3)
Preste
contas do Fundo Social de Solidariedade (FSS) sempre em reunião de cúpula,
antes da publicação oficial e rejeite qualquer proposta de alteração no
projetos do FSS nesta reunião, exceto os corretivos redacionais. Aceite, é
claro, sugestões para a gestão do fundo, mas, antes ou depois da reunião, nunca
em seu curso. Seguem um motivo e uma desculpa. O motivo: a busca pela
depreciação da capacidade gestora de uma mulher de comando é o primeiro passo
para sua desmistificação. Em outras palavras, a mulher deve sustentar um charme
místico que seu poder emana. É um tipo de charme que incomoda os homens e,
ciente disso, a mulher deve trancafiar seu lado místico – se necessário –
através da intransigência, quando rodeado de poderosos e sanguessugas. Uma
desculpa, se preciso for reagir com essa tal aspereza: se há algum desencontro
em seus projetos do FSS, que tal aguardar uma manifestação da câmara de
vereadores a respeito? (Eles, os vereadores, quase nunca se preocupam com
isso!);
4)
Aproxime-se
das esposas dos secretários municipais ou equivalentes e tente doutriná-las em
favor de suas causas pessoais. O ingrediente de serem todas mulheres facilitará
substancialmente esta ação. Agora, é importante: este conselho não vale para a
esposa do chefe de gabinete (aquele, do conselho anterior!). Geralmente, ela
será sua rival nas urnas um dia. O que poderia acontecer com o estreitamento
amigável você já pode prever, não é?!;
5)
Promova
jantares e reuniões informais sempre convidando políticos diminutos. Esqueça os
líderes. Ninguém lidera sem liderados. Os caciques devem comparecer em reuniões
solenes e você não deixará de ser convidada simultaneamente, pois é a esposa do
cacique maior. Justifique-se sempre pela simplicidade da recepção e ponto. Os
caciques ficarão agradecidos por você considerá-los dignos de glamour. Quanto à curiosidade sobre o
que deve ter sido tratado naquele encontro, deixe que as “bocas pequenas”
correrão com as notícias, invariavelmente distorcidas;
6)
Visite
todas as pessoas que resolveram abandonar a política, e procure saber seus
motivos. Porém, nunca lhes aconselhe a volta. Fatalmente voltarão (ou
patrocinarão alguém);
7)
Nas
reuniões, em que ambos estiverem presentes, sempre contrarie – com sutileza –
os secretários ligados às finanças; apóie sempre os conselheiros municipais e
seja a madrinha da Defesa Civil (aqueles responsáveis pelos resultados de
catástrofes em todos os sentidos). Se não existir o setor, ou conselho,
apresse-se em exigir sua criação. Só este ato será capaz de criar condições de
prever catástrofes materiais à população e patrimoniais ao município;
8)
Sugira
um departamento jurídico misto de advogados e advogadas. Não sendo possível,
contrate uma para o Fundo Social de Solidariedade (ainda que seja recém
formada);
9)
Depois
de qualquer reunião, não importa a hora (mas respeite o local, é claro!),
dissimule, seduza o prefeito, proponha-lhe um relaxamento e utilize técnicas de
relaxamento e antiestresse, com o infalível pompoar no penúltimo ato (o último
seria aquele em que você deita o parceiro em seus braços para fazer um cafuné).
Se ele tiver saído vitorioso daquela reunião, saberá que há alguém mais forte
que ele à sua volta; se saiu derrotado, saberá que alicerce não desmorona.
Do Livro: "A Primeira-Dama e sua Intimidade com o Poder " (no prelo)
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